segunda-feira, 23 de março de 2009


O que não pode faltar na CRECHE

Para que as turmas de 1 a 3 anos se desenvolvam plenamente, é preciso conhecer as características de cada faixa etária e garantir que algumas experiências essenciais façam parte do planejamento. Saiba como trabalhá-las e porque são tão importantes

Beatriz Santomauro (bsantomauro@abril.com.br) e Luisa Andrade. Colaboraram

Bianca Bibiano, Denise Pellegrini, de Curitiba, PR; Julia Browne, de Belo Horizonte, MG; Thaís Gurgel, de Sobral, CE; e Vilmar Oliveira, de São José dos Campos, SP.

Brincar


BRINCAR Brinquedos com peças de montar, encaixar, jogar e empilhar possibilitam desafios.
Foto: Diana Abreu

Por que trabalhar Embora a brincadeira seja uma atividade livre e espontânea, ela não é natural, mas uma criação da cultura. O aprendizado dela se dá por meio das interações e do convívio com os outros. Por isso, a importância de prever muito tempo e espaço para ela. "Temos a c

apacidade de desenvolver a imaginação - e é essa habilidade que o brincar traz", diz Zilma de Oliveira, da Universidade de São Paulo (USP).

O que propor Uma das primeiras brincadeiras do bebê é imitar os adultos: ele observa e reproduz gestos e caretas no mesmo momento em que acontecem. Com cerca de 2 anos, continua repetindo o que vê e também os gestos que guarda na memória de situações anteriores, tentando encaixá-los no contexto que acha adequado. Tão importante quanto valorizar essas imitações é propor ações físicas que possibilitam sensações e desafios motores. "É pela experimentação que a criança se depara co

m as novidades do espaço, sente cheiros e percebe texturas, tamanhos e formas", explica Ana Paula Yasbek, coordenadora pedagógica da Escola Espaço da Vila, em São Paulo.

Alguns brinquedos também fazem sucesso nessa fase. Os mais adequados são os de peças de montar, encaixar, jogar e empilhar, além dos que fazem barulho. É preciso

ter cuidado com a segurança e só usar objetos maiores do que o tamanho da boca do bebê quando aberta.

Para um trabalho eficiente, uma boa estrutura é essencial. Isso inclui ter material suficiente para que todos consigam compartilhar e um bom espaço de criação. "Os ambientes devem ser convidativos e contextualizados com a história que se quer construir", diz Ana Paula. Uma área ao ar livre, mesmo que com poucas árvores, vira uma grande floresta. Uma sala bem cuidada, rica em c

ores e com variedade de brinquedos e estímulos igualmente possibilita momentos criativos, prazerosos e produtivos.


BRINCAR Momento de construir histórias (à esq.) e perceber formas (no centro) e texturas (dir.).
Fotos: Marcos Rosa e Diana Abreu

Esta creche faz Em Vitória, capital capixaba, a brincadeira é parte da rotina diária da CMEI João Pedro de Aguiar. As salas das turmas de 2 anos, por exemplo, são divididas em cantos. Num deles ficam os brinquedos de madeira para montar. Noutro, bichos de pelúcia e bonecas. Num terceiro, livros. Tudo em uma altura que permita a todos pegar o que querem sem ajuda. Diariamente, a classe passa um bom tempo no pátio, em que uma área é forrada de areia e outra acomoda brinquedos de plástico, como escorregador e cavalinho de balanço. "Ali, os pequenos correm e encontram amigos de outras turmas para que tenham a oportunidade de viver novas situações", diz a coordenadora pedagógica Wanusa Lopes da Silva Zambon.

Linguagem oral

Por que trabalhar Quando o bebê se expressa com gritos ou gestos, ele tem uma intenção. "Mesmo os que têm pouco vocabulário ou que ainda não falam com desenvoltura estão participando da atividade comunicativa de forma competente e correta", diz Maria Virgínia Gastaldi, Editora de Educação Infantil da Editora Moderna. Para que a linguagem oral se desenvolva, cabe ao professor reconhecer a intenção comunicativa dos gestos e balbucios dos bebês, respondendo a eles, e promover a interação no grupo.


LINGUAGEM ORAL Gestos (à esq.), diferentes expressões faciais (dir.), balbucios e gritos dão início à fala.
Fotos: Marcos Rosa e Diana Abreu

O que propor Desde muito cedo, cantigas de roda, parlendas e outras canções são meios riquíssimos de propiciar o contato e a brincadeira com as palavras e de estimular a atenção a sua sonoridade. "O burburinho das conversas entre os pequenos, falando sozinhos ou com os outros, é riquíssimo. Não se admite mais a idéia de manter a sala em silêncio, com aparência que está tudo ‘sob controle’", diz Regina Scarpa, da FVC.

As rodas de conversa, feitas diariamente, são uma oportunidade de praticar a fala, comentar preferências próprias e trocar informações sobre a família. Nessa situação, há a interação com os colegas e aprende-se a escutar, discutir regras e argumentar. Quanto menor for a faixa etária do grupo, mais necessária será a interferência do educador como propositor e dinamizador dos diálogos.

Esta creche faz Todos os dias, a turma de 2 anos da EMEB Valderez Avelino de Souza, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, participa de rodas de conversa. Nessa fase, acontecem relatos de experiências pessoais no bate-papo, além da invenção de outros elementos. Foi o que aconteceu no dia em que um dos pequenos contou que tinha visto um tubarão. "Outro completou dizendo que aquilo tinha sido na praia e um terceiro falou que nadava como o bicho", conta a coordenadora pedagógica Pétria Ângela de Jesus Rodrigues Ruy dos Santos. A professora foi puxando o assunto e encaminhando a conversa. Um garoto, que até então estava quieto, saiu-se com esta: "Meu pai pescou um tubarão. Ele era enorme. Professora, quer ir pescar com meu pai?" Sabendo que é muito comum nessa fase mesclar informações reais com outras tiradas da imaginação, ela, é claro, aceitou o convite.

Movimento

Por que trabalhar O movimento é a linguagem dos pequenos que ainda não falam e continua sendo a maneira de se expressar daqueles que já se comunicam com palavras. "O pensamento é simultâneo ao movimento e, por isso, não se pede que eles fiquem sentados ou quietos por muito tempo. Evitar que se mexam é o mesmo que impedi-los de pensar", explica Maria Paula Zurawski, assessora de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Portanto, quanto mais o professor incentivar o movimento, maior será o aprendizado de cada um sobre si mesmo e o desenvolvimento da capacidade de expressão.



MOVIMENTO Livres sobre colchões, os bebês podem andar e passar por obstáculos, como bambolês (esq.). Na creche, os pequenos vão conhecendo os limites do corpo e as conseqüências das ações (dir.).
Fotos: Marcos Rosa

O que propor O bebê precisa participar de atividades que ampliem o repertório corporal para que percorra um caminho de gradativo controle dos movimentos até conseguir se levantar e andar. Aos poucos, ele passa a ter consciência dos limites do corpo e da conseqüência de seus movimentos. São situações indicadas para o amadurecimento motor passar por obstáculos como túneis, correr e brincar no escorregador.

Os espaços da creche devem ser desafiadores e, ao mesmo tempo, seguros. São ambientes propícios para as atividades desse tipo tanto o pátio como a sala. Ali, são colocados bancos ou caixas que sirvam de apoio para os que estão começando a andar e ficam distribuídos brinquedos de equilíbrio. Enquanto a turma se mexe para lá e para cá, não se perde um lance. Um educador atento sabe quando um suspiro revela cansaço ou uma careta demonstra algum desagrado.

Esta creche faz Brincar, dormir, mamar, almoçar e dançar acompanhando o ritmo da música. A turma de 1 ano da CEI Cidade de Genebra, em São Paulo, não pára quieta. "Logo que acordam, os bebês tomam mamadeira e saem dos colchonetes quando querem. Como não há berços, eles têm liberdade para se movimentar", diz a professora Anali Pereira dos Reis. No solário, com brinquedos de plástico e espaço para correr, eles escorregam, se balançam na gangorra e andam no cavalinho. Mesmo tão novinhos, já são craques no sobe-e-desce e no equilíbrio. Faz pouco tempo que aprenderam a andar, mas já entram nos carrinhos de plástico e saem dele sem ajuda e se divertem passando por dentro de bambolês, dando cambalhotas e rolando nos colchões.

Arte


ARTE Materiais de texturas e cores variadas, como tintas comestíveis, aguçam os sentidos.
Foto: Marcos Rosa

Por que trabalhar A música e as artes visuais são dois meios de os pequenos entrarem em contato com o que ainda não conhecem. Nessa fase, as linguagens se misturam e um mesmo objeto, como um giz de cera, pode ser usado para desenhar ou batucar. "Aqueles que têm oportunidade de participar de atividades nessas áreas certamente desenvolvem mais a capacidade cognitiva", diz Silvana Augusto, formadora do Instituto Avisa Lá.

O que propor Quanto mais variadas as experiências apresentadas, maior a garantia de qualidade no desenvolvimento do grupo. Escutar sons, como os produzidos por batidas em várias partes do próprio corpo e pela manipulação de objetos, ouvir canções de roda, parlendas, músicas instrumentais ou as consideradas "de adulto" faz a diferença nessa fase. Além de ouvir e repetir um repertório já conhecido, a turma deve ser orientada a improvisar e criar canções, brincar com a voz, imitar sons de animais e confeccionar instrumentos. "A música contribui para um desenvolvimento pleno e harmônico, já que incide diretamente na sensibilidade, na expressão e na reflexão", afirma Teca Alencar de Brito, co-autora do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.

Da mesma maneira, o ideal são atividades de artes visuais diversificadas. Uma boa prática inclui desenhos - e não o preenchimento de modelos prontos -, pinturas ou esculturas usando diversos materiais e possibilitar o contato com novos recursos visuais para ampliar as referências artísticas. As produções da classe ficam à disposição para que sejam observadas e comentadas e para que cada um reconheça o que é de sua autoria.

Esta creche faz No EMI Josefina Cipre Russo, em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, artes visuais e música fazem parte do cotidiano dos pequenos de 3 anos. Eles criam instrumentos com materiais reciclados e acompanham as músicas dançando e cantando. No dia-a-dia, eles desenham com giz, lápis, guache e aquarela, fazem esculturas e mexem com massinha e tintas comestíveis. Assim, a turma sente cheiros e texturas e aprecia cores diferentes. "As tintas são caseiras e dá para limpá-las facilmente. Colocar na boca ou deixar cair na roupa não é problema", diz a diretora, Eliane Migliorini.

Identidade e autonomia



Por que trabalhar O bebê nasce em uma situação de total dependência e, pouco a pouco, necessita se tornar autônomo. "Enquanto adquirem condições para realizar ações, as crianças começam a saber das conseqüências de suas escolhas", explica Beatriz Ferraz, coordenadora pedagógica do Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária, em São Paulo. Autonomia e identidade se desenvolvem simultaneamente e, mesmo num ambiente coletivo, é preciso dar atenção individualizada às crianças.


AUTONOMIA Escolher o que gosta e aprender a se alimentar sozinho é caminho para se tornar independente (esq.). IDENTIDADE Painéis de fotos são úteis para que cada um se reconheça e encontre os colegas (dir.). Fotos: Marcos Rosa

O que propor As melhores experiências são as pautadas pelo relacionamento com os outros e pela demonstração de preferências. "Se a criança não tem opção, como vai decidir?", diz Cisele, do Avisa Lá. É essencial oferecer possibilidades - na hora da brincadeira ou da merenda, por exemplo - para que os pequenos sejam incentivados a se conhecer melhor e a optar. Ao servir os alimentos sem misturá-los, o educador permite a cada um identificar aquilo de que mais gosta. Oferecer a colher para que todos comam sozinhos também é primordial. Por meio da observação, uns aprendem com os outros. Mesmo que no começo façam sujeira e demorem para se alimentar, aos poucos adquirem a destreza do movimento.

A organização do ambiente em cantos de atividades é outro meio de favorecer o exercício de escolha, já que cada um define onde brincar, com quem e por quanto tempo. Para ajudar na construção da identidade, cabe ao educador chamar cada um pelo nome e ressaltar a observação dos aspectos físicos individuais. "Colocar grandes espelhos nas salas, ter fotos de cada um junto dos cabides em que penduram as mochilas, identificar as pastas com o nome e um desenho, por exemplo, são ótimas maneiras de estimular a atenção para as próprias características e fazê-los perceber a diferença e semelhança em relação aos colegas", diz Cisele.

Esta creche faz Na turma de 2 anos da CEI Jacyra Pimentel Gomes, em Sobral, a 248 quilômetros de Fortaleza, cada criança vê o nome escrito, reconhece a própria foto e aprecia imagens da família nas paredes da sala. A coordenadora pedagógica Carlinda Maria Lopes Barbosa diz: "Cada um entende que é diferente do amigo por ser identificado de outra maneira". Para reforçar esse aprendizado, explica-se que existem objetos que são compartilhados e outros individuais, como a mochila e as roupas.

Reportagem sugerida pelos leitores

Sara Alves de Souza, São Paulo, SP
Teresa Cristina Serejo Pinto, São Luís, MA
Adriana Santos Silva, Camaragibe, PE
Maria Aparecida Braga de Campos, São Paulo, SP
Fabiana Bartholomeu, Guarulhos, SP

3 perguntas
Denise Argolo Estill


Denise Argolo Estill
Foto: Rodrigo Erib

Psicóloga e psicopedagoga do Infans - Unidade de Atendimento ao Bebê, de São Paulo, fala sobre o que caracteriza o desenvolvimento das crianças da creche.

O que distingue os três primeiros anos de vida?
Esse é o período sensório-motor, caracterizado pela inteligência prática. O mundo é algo a experimentar e conhecer por meio dos órgãos dos sentidos e das ações corporais.

Como a criança aprende?
Presa à experiência imediata, ela necessita da presença dos objetos concretos. Seus esquemas de ação são olhar, agarrar, ouvir, alcançar com a boca ou sentir com a pele.

Quais os procedimentos para potencializar o desenvolvimento nessa faixa etária?
A primeira coisa a fazer é incentivar o uso da ferramenta mais poderosa, que é o corpo. Por meio dele, a criança entra em contato com texturas, temperaturas e gostos. Outras ações são estimular a linguagem verbal - por meio de histórias e músicas - e a imitação, entendendo a necessidade de reproduzir gestos e falas e procurando valorizar a expressão individual de cada um.

Quer saber mais?

CONTATOS
CEI Cidade de Genebra, R. Cachoeira Poraquê, 100, 05576-600, São Paulo, SP, tel. (11) 3781-1290
CEI Jacyra Pimentel Gomes, R. Rio Negro, s/nº, 62100-000, Sobral, CE, tel. (88) 3614-4352
CEI Maria do Rosário Bastos, R. Coronel Virgílio Silva, 1675, 37701-103, Poços de Caldas, MG, tel. (35) 3697-2172
CMEI Dr. Arnaldo Carnasciali, R. São José dos Pinhais, 900, 81920-250, Curitiba, PR, tel. (41) 3289-4241
CMEI João Pedro de Aguiar, R. Julia Lacorte Pena, s/nº, 29090-210, Vitória, ES, tel. (27) 3337-3316
CMEI Patrícia Galvão, R. 113, s/nº, 07085-330, Guarulhos, SP, tel. (11) 2456-7844
Creche Conveniada Lírios do Campo, R. João Gomes da Silva, 121, 12248-674, São José dos Campos, SP, tel. (12) 3929-6741
EMEB Valderez Avelino de Souza, R. Lázaro Zamenhof, 110, 09861-670, São Bernardo do Campo, SP, tel. (11) 4351-4600
EMI Josefina Cipre Russo, R. Pernambuco, 100, 09520-170, São Caetano do Sul, SP, tel. (11) 4224-1170
UMEI Mangueiras, R. Coroa de Freitas, 328, 30666-230, Belo Horizonte, MG, tel. (31) 3277-9189

BIBLIOGRAFIA
A Formação do Símbolo na Criança, Jean Piaget, 376 págs., Ed. LTC, tel. (21) 3970-9450, 83 reais
Bem-Vindo, Mundo! Criança, Cultura e Formação de Educadores, Silvia Pereira de Carvalho e outros, 208 págs., Ed. Peirópolis, tel. (11) 3816-0699, 40 reais
Educação Infantil: Fundamentos e Métodos, Zilma de Oliveira, 258 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3611-9616, 36 reais
Henri Wallon: Uma Concepção Dialética do Desenvolvimento Infantil, Izabel Galvão, 136 págs., Ed. Vozes, tel. (11) 2081-7944, 20 reais


Retirado daqui

1 comentário:

Mil Folhas disse...

Obrigada pela partilha :) gostei especialmente da foto do bebe a comer cereais Cherios :) curiosamente eram os meus preferidos em criança, porque a minha mamy lhes metia mel!!!!!